Figura Israelita do Ano 2005
O último golpe de mestre de Sharon
Em sua autobiografia "Guerreiro", Ariel Sharon conta como teve a idéia de criar um partido. No início de 1973, logo depois que entrou para a reserva, aos 45 anos, como o maior comandante de campo de Israel, Sharon dirigia o trator em sua fazenda no Neguev e pensava no que faria da vida a partir dali. Para estimulá-lo, tinha de ser algo que fizesse diferença, assim como tinha sido sua brilhante carreira militar até ali, de herói nas guerras de 1948 e 1956 e grande comandante da divisão de tanques da guerra de 1967 (a de outubro de 1973, quando seria reconvocado, ainda estava por vir).
Sharon começou então a pensar sobre o cenário político de Israel, engessado pelo domínio do Partido Trabalhista antes mesmo da criação do Estado, desde os tempos da Agência Judaica, que organizou a imigração. A oposição fragmentária de uma dezena de partidos pequenos de oposição, incluindo o Herut, do preeminente Menachem Beguin, que se digladiavam entre si, mantinha aquele domínio incontestável. Sharon poderia se candidatar a uma cadeira de deputado, que ganharia facilmente com sua reputação de soldado. Mas era pouco para estimulá-lo.
"Isso lançaria a idéia para o público de uma forma mais dramática", recorda no livro, publicado em 1989. "Se atraísse alguma atenção da mídia ou apoio popular, eu ficaria então numa posição forte para abordar Beguin e os outros." Com o dinheiro da venda de duas toneladas de feno, Sharon alugou um salão no Edifício da Imprensa de Bet Sokolov, em Tel-Aviv, e lançou a sua proposta. Depois de meses de confabulações com os políticos, nascia o Likud, que passaria a dividir o poder com os trabalhistas.
Mais de 30 anos depois, Sharon, agora primeiro-ministro de Israel, tentaria o truque mais uma vez. Sintonizado, como três décadas antes, com os sentimentos dos israelenses comuns e da mídia, Sharon rompeu o impasse em que Israel estava mergulhado. De um lado, a disposição trabalhista de negociar a paz e oferecer concessões a uma liderança palestina que não queria ou não podia conter a violência. De outro, o Likud, representado até então pelo próprio Sharon e, sobretudo, pelo seu atual líder, Binyamin Netanyahu, mais inclinado em impor suas condições aos palestinos e garantir a segurança de Israel a ferro e fogo. As duas opções foram reiteradamente testadas, e fracassaram, com Israel cada vez mais vulnerável ao terrorismo islâmico, o que a ocupação da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, com suas fronteiras porosas, só ajudava a agravar.
Num rompante que lembrou suas manobras surpreendentes no Deserto do Sinai, Sharon resolveu retirar os soldados e os 8,5 mil colonos judeus da Faixa de Gaza, passando como uma divisão de tanques sobre as resistências de seu Likud. Isso foi em agosto. Em novembro, movido tanto pelas resistências internas de seu partido, como pela intuição de que havia um espaço, no centro do espectro político, a ser ocupado, Sharon criou o Kadima, que traz consigo um significado, afinal, militar: Adiante.
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